Corpo sem sinônimo

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N A V A R R O

curadoria Ana Luisa Lima

Museu da Fotografia – Cidade de Curitiba 2016

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Perro, ou arroz de puta, ou o dia em que minha avรณ quebrou um prato na cabeรงa de minha tia



Ela que já era corpo-fala, paralisava. Paralisava até dormir. O não, não faça, não toque lhe provocava um ato de resistência. O corpo-muralha era formado naquele instante, reação a uma voz que vinda de maior altura lhe forçava ser ereta. Era a fala do outro que acionava aquilo que começara conhecer como potência de um corpo. O que se pode contra alguém que no silêncio, na paralisia confrontante lhe devolve o não? A palavra entrando por dentro lhe conduzia ao sono e quem poderia interromper o sono de uma criança cansada?



Tinha qualquer coisa de vacilo na escuta. Sem que soubesse ao certo se por distração ou por deficiência auditiva leve, perdia falas, frases e pessoas. Tinha na voz uma oscilação. Diante de homens mais velhos era seguro. Diante de mulheres mais velhas era onda. Diante de crianças, com. Diante de mulheres de sua idade, por. A pontinha da língua que insistia em acompanhar os Ss entregava o recalque do pai, depois de certa idade manter aquela fala tornou-se resistência. Não era gay como temia o velho, mas achava importante o clichê do som preso e o paradoxo do corpo rude que trazia na vozcorpo a rebeldia do menino-homem. Feito de pequenas suavidades decidiu cantar.



NĂŁo sabia falar sem impostar a voz. Fez um calo, depois uma fenda. Lhe impediram de gritar na igreja. A mulher mais tarde agradeceu ao calo, a fenda e ao coveiro que fechou o tĂşmulo com menos de 72 pĂĄs.



o sotaque ninguém nunca soube identificar de onde era perguntavam-lhe se vinha do Pará, se havia morado no Rio de Janeiro, se era mineira e se respirava bem descobriu que pisar firme impulsionava a voz em manifestações se dispunha logo à frente uma bala de borracha acertou-lhe o pescoço deslocando a traqueia foi hemorragia nem operações, nem exercícios segue pisando forte e segurando firme a bandeira que passou a agitar com maior velocidade



Deslizando para fora de casa corre até o quintal, a euforia da corrida de Formula 1 lhe excita. Quer pilotar, quer acelerar, quer sentir as mãos suadas dentro de uma luva, quer roçar o corpo em um macacão com propaganda de cigarro, quer um capacete. O balde verde dança sobre a cabeça. Corre. Ela corre. Ela pilota. Na coxa direita lhe rompe um tranco. O corpo é jogado para baixo. Um desmaio. Alguém que lhe toma nos braços.



Cheia, ali parada no balcão julgava cada mulher que entrava. O cabelo seboso e amarrado ia até o cóccix. Homem nenhum havia lambido aquele cóccix, nem lamberia. Gostava de transcrever as palavras que ouvia de alguém gritando distante: você já teve seu nome escrito no livro da vida? o seu nome precisa estar escrito, você precisa escapar da TV. Apocalipse versículo 15 capítulo 20.



E porque era pedra, era ela linda. Na torsão do corpo se adiantava a quem vinha em sua direção. Taila, Mônica, Alini, Tifani, Tereza, Adrieli, Ellen, todas, ela, anal total, GP, GB e acessórios. Ela, a poderosa. No fundo o sonho era apenas carregar uma peruca, sem afeto mesmo, mas de algum modo o corpo de alguém.




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VERBETES OU COMO (RE)CONHECER UM CORPO SEM SINÔNIMO Ana Luisa Lima

Algumas narrativas são difíceis de apreender se não estamos atentos às nuances de seus enredos. Penso que anos se passam a favor de uma oportunidade de entender as coisas com mais clareza. Talvez, haja no íntimo da jornada a chave que faz abrir o conhecimento que apenas o guardamos como intuição. Por certo, as construções de conhecimento – de qualquer ordem – não são lineares. É como montar um Quebra-cabeça. Começar por aquilo que faz sentido. Refazer o cenário a partir dos campos de cor, ou pelas bordas com seus ângulos retos. Mas há sempre algo que impulsiona, e nunca é de maneira racional, o desejo de encaixar partes que, inicialmente, não fariam sentido juntas.

Eu estava abrindo o portão que dá para o jardim da casa, quando vi meu pai saindo pelas portas dos fundos. Sentia-me muito irritada para perceber que ele levava consigo mais malas do que lhe era comum. Andava envergado como mula de carga. Acabei me irritando com ele ao ouvi-lo assoviar, como de Costume, a mesma música que lhe era um mantra. Quando cheguei na varanda, vi lá sua rede azul pendurada. Para mim, era a garantia de seu retorno. Mas não. A última presença de meu pai foi alardeada pelo cão rouco e cinzento da vizinha tagarela. 40


As coisas de falar e de pensar: nada há de bidimensional. No lugar do quebra-cabeça que nos acostumamos jogar desde crianças, pensemos num jogo de peças de montar em formato esférico. Sem começo, nem fim. Sem hierarquias de vetores: sem prioridades de direções ou sentidos. Um conjunto de conhecimentos que se equilibra entre sinônimos e antônimos. De alguma forma complementares, irregulares, plurais. Nesse Jogo, cada informação nova assume, por um momento, um foco que reconfigura os modos de entender. Faz dilatar os modos de perceber e sentir. É como criar mais uma janela dentro de uma arquitetura que habitamos que ajuda a contemplação do Todo.

Ao entrar na sala, dei de cara com mamãe recolhendo cacos de vidro do chão. Não sabia ao certo o que pensar daquilo. Por pragmatismo, conclui que tinha sido um dos seus muitos descuidos. Já naquela época, ela não andava boa das mãos. No dia anterior, fiquei sabendo que ela tinha deixado cair um prato, no dia anterior a esse, um vaso de porcelana que a vó, mãe de papai, tinha dado no penúltimo natal. Levei minha irritação para o quarto que costumava ser meu. Ela o havia transformado numa espécie de Refúgio particular em tempos em que a lucidez lhe parecia custar mais caro do que os dias considerados normais. Quase não havia sobrado espaço vazio nas paredes. Todas elas foram tomadas pelos livros e objetos aleatórios que pareciam lhe ter algum significado.

O saber Esférico é aquele que distingue que a descoberta da potencialidade de um ponto não esmaga a existência de um outro ainda não reconhecido em forma, mas intuído como presença. 41


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Por muito tempo tentei diagnosticar os sintomas de mamãe. O excesso de Silêncio, o excesso de descuidos, o excesso de desapego. Pouco antes de me casar e me mudar para outra cidade, passei a ir na casa dela duas vezes por semana. Criei o hábito de anotar num caderno suas manias e fazer um inventário dos títulos e tralhas que ela estocava naquele quarto. Não demorou para entender que sua rigidez não era menos anormal do que a doçura de meu pai. Devo confessar que passar pelos meus momentos de transtorno eram mais fáceis ao lado de minha mãe. Com ela, eu não havia necessidade de me justificar; para ela, havia nada do que me redimir. Era fato que meu pai jamais me perguntou sobre nada, mas de alguma maneira os seus gestos olhavam transtornados para muitas de minhas contradições. Estarmos juntos, eu e mamãe, por si só, era suficiente. De alguma forma, acabávamos arrumando um jeito de sobreviver a nós mesmos.

Não podem ser desconsiderados os modos de estruturar o mundo que não cabem nas palavras. Talvez, haja nesse esconderijo do conhecimento uma maneira concreta de fazer-se Perceptível. Porque as coisas que sabemos são apenas contornos das coisas que ainda não sabemos. E é o não-saber que impulsiona a Existência em seu estado criativo.

Os meus dias de casada não foram muitos. A morte do voto veio antes da morte do corpo. Também não foram poucos. Ainda hoje lido com os estragos daquela vida a dois que deveria ter sido evitada. Nos traímos, sobretudo, em convicções que, bem ou mal, era o que havia nos feito encontrar. O encontro deveria nos ter sido suficiente e não esgarçá-lo por Inabilidade de dizermos não. Então: eu disse sim. Sob a benção de um deus que não conhecia. Ele disse sim. A uma mulher que não fazia ideia quem era. 43


Imaginemos uma grande Biblioteca cujas as capas dos livros se desprenderam de seus miolos, e que os miolos perderam suas páginas, e as páginas deixaram desvanecer algumas palavras. Esse é o estado natural do verdadeiro conhecimento de Tudo o que existe. Nossas tentativas de tornar científico o conhecimento, é uma tentativa, nem sempre generosa, de juntar algumas páginas, ainda que não tenha descoberto, ao certo, quais são as palavras apagadas pelo Tempo. Ainda assim, fazemos caber numa capa que abraça os fragmentos como se fossem o todo e criam a ilusão de inteireza.

Faz pouco, o perceber que nunca me consenti começar a entendê-la. Eu desejava tanto aquela mulher que me deixei ser dela com a mesma Naturalidade de quem respira. Ainda assim, não quer dizer que respirar era fácil. Às vezes, tinha algo de seco, algo de rarefeito, e sobreviver tinha que ser pela boca.

Nada pode ser desvendado porque a natureza das coisas é da ordem da reinvenção. Aquilo que é, nunca é. Está sempre recomeçando a re-existir dentro de um tempo dobrado num espaço igualmente Mutável.

A mim, ainda custa muito caro tentar apreender o que deu errado. Antever o movimento anterior ao Xeque-mate. Não que pudesse acreditar em sermos felizes, menos ainda, inseridos num pra-sempre. Mas, desde muito cedo, aprendi a ler o prazo de validade das coisas. É certo que nunca fui boa em retórica, em dar explicação para as coisas. Mas algo que sempre pude fazer foi usar todos os canais de percepção do meu corpo para prever certos depois. Um depois nunca é aleatório. Esse se desenha de fragmentos do antes com os gestos do agora. 44


As produções de sentido são uma necessidade humana de criar pontos que ajudam a se deixar caber no Tempo.

Ele sempre teve uma média razoável de previsibilidade. Nunca soube ao certo como descolar o sentir dos seus respectivos sintomas. Algumas verdades não lhe eram uma virtude, mas degredo. Quando sorvi o Hálito de seu modo de existir, me tornei, eu mesma, a maior das contradições. Tudo o que, em mim, era cinismo e ameaça foi domesticado por sua presença. Com ele, eu sentia uma conexão extraterrena. Ao lado dele, pairava uma quietude, uma sensação de apaziguamento impossível de descrever.

Havia em nós alguma Linguagem que se dava para além das linguagens. Nossa tagarelice intelectual parecia trazer criptografado aquilo de banal que de fato queríamos nos dizer. Acredito que algo de desonesto e muito vulgar nos atravessaria a alma, se trocássemos afeto com as mesmas palavras que os bilhões de mortais. Havia algo de raro que nos pertencia. Algo de par que nos fazia muito seguros daquele estarmos juntos.

A real revolução encontra movimento nos pequenos gestos. Naqueles momentos em que sucumbir é mais simples e sem dor. Permanecer é um verbo que articula grandezas. Como um corpo fincado sobre si mesmo. Quando ele mesmo é paisagem a ser consultada nos momentos que os olhos apenas enxergam sem ver. Confundem o Vazio inquieto de dentro com a imensidão do que se estende para fora. 45


Eu o conheci do modo mais Ordinário possível. Apaixonei-me por ele por descuido. Numa fila de botequim, onde todo tipo de gente se amontoava para conseguir uma cerveja gelada e um pedaço de pizza fria. Não era muito mais do que um cubículo com três geladeiras e dezenas de caixas de bebidas empilhadas sem ciência. Sempre que via a cena, em minha cabeça, antevia o desastre com aquelas centenas de garrafas que despencariam, sem dar aviso prévio, sobre aquele senhor de aparência equivocada para aquele seu ganha pão.

Aquele senhor sempre estava de camisas de tecido com todos os botões em suas casas devidas. As mangas eram sempre longas, não importava a estação. O que lhe diferia em moda inverno e moda verão eram as cores. Os tons terrosos não sabiam se seguiam à primavera ou outono. Atrás dos seus óculos de armação muito grossa, seus olhos se arregalavam toda vez que o chamava pelo nome. Eu era a Única voz que ele parecia discernir naquele emaranhado de súplicas. Acho que isso tinha a ver com aquele episódio que tivemos certa vez, quando ébria, não pude ajustar os passos a caminho de casa e exausta me desfiz a três metros da portinhola do boteco.

Resistir. Nenhuma Força é capaz de intimidar a resiliência de quem se sustenta pela própria vontade.

É bom sentir que algo, em mim, está adormecido. Porque desde os primeiros sintomas de separação sentia agulhas. Estocadas de dentro pra fora que me faziam sangrar lembranças muito amargas que nem o cigarro dava conta de


desmentir. Uma acidez no estômago me enfraquecia as vontades. Atendia a uma fome sem ter fome que me engordava o corpo e jamais amortecia os desconfortos da Alma. Desenvolvi o talento de criar rotinas para sobreviver o passar do tempo que insistia em estancar.

O Risco não pode ser confundido com apagamento. Mas sim, um traço cicatriz que aprofunda a leitura. Que corpo é esse que não descansa?

Houve um tempo que alguma razão conseguiu desfazer aquele estado febril diário interessado apenas em convocar o sangue para rituais de autoindulgência. Nos poucos momentos de lucidez, eu abria mão daquele sacerdócio que jamais esteve autorizado a espiar culpas. Passado o tempo dos desmoronamentos de todo e qualquer significado que preenchia os vazios de dentro, conviver com a ruína era seguir existindo em estado límbico. Porque a sensação de alguém por perto é o que suborna os frios que fazem tremer a alma nunca livre de seus próprios medos. A Cumplicidade de uma vida a dois é o que não me permitia existir em função da deriva que me fundou. Saberme ancorado, ainda que limitasse meus desejos de flanagem, aquece melhor a alma do que a solidão de uma existência errática.

Eu sentia certa desolação ainda que tivesse plena consciência de que o tempo que conseguimos passar juntos só foi possível através de uma fé na fé e certa arrogância. Antes do fim, lhe pedi que me amasse não mais como esposa, ou amiga, mas uma estranha. Com quem se é possível subverter a moralidade dos gestos. Em nosso Último êxtase, estávamos bem encaixados, como se 47


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tivéssemos lido em algum lugar o manual de uso das ferramentas de nossos corpos. Cada toque acontecia com tanta precisão e leveza. Era a coreografia perfeita previamente ensaiada por cinco anos, com seus momentos de lesões, desânimos e cansaços. Quando pousei o meu rosto entre os seios dela, me consenti, naquele instante, agradecer ao deus por aquela mulher. Nem demoníaca, nem santa.

Mamãe é alguém que me comove a alma, ainda que seja a mais estranha das criaturas que já convivi ou mesmo ouvi falar. Seus gestos se movem entre os muitos estados de se demonstrar indiferente que têm Aparência de certa grosseria. Eu nunca entendi sua opção por ter filhos. Fico me perguntando se em algum momento de sua vida ela deixou se submeter aos caprichos de ser considerada uma pessoa ‘normal’.

Por muito tempo supus que o que a tinha levado a esse modo de vida radicalmente desapegado foi a morte do meu irmão mais novo. Até que um dia, li numa folha de caderno, guardada num dos seus muitos livros de psicanálise, uma anotação muito lúcida sobre a inviabilidade de conduzir sua existência atrelada aos sentimentos, desejos, necessidades de qualquer pessoa. Ainda que conseguisse entender o anelo por afeto e reconhecimento, o que provavelmente tornava todo humano em humano, tal Desejo era em si mesmo um modo de se conduzir pela existência, desde seu início, inconstante e arbitrário. E diante da arbitrariedade, era possível construir para si qualquer produção de sentido. Inclusive o de não se deixar definir por essa produção de sentido. Isso que ela tinha escrito datava seus trinta e dois anos. Confesso que por vezes acho aborrecido que mamãe não se deixe enternecer facilmente. 49


Quando nos separamos, decidi deixar tudo para trás, inclusive qualquer Vestígio de uma vida que por ventura pudesse me levar a fazer as mesmas escolhas. Não sabia ao certo por onde começar. Cada hábito, por mais simples que fosse, estava entrelaçado com o pequeno mundo que construímos para nós. Decidi abraçar uma vida imigrante, aproveitar as alianças políticas que naquele momento pareciam esboçar uma nova configuração entre os países do Sul. Afinal de contas, era animador que eu pudesse finalmente aceder à vontade que sempre tive de conhecer as particularidades culturais que se de um lado nos distanciavam como povo, por outro, eram o que justamente nos colocavam numa situação de irmandade, visto que aquelas dessemelhanças haviam nascido de um passado comum.

Nunca soube ao certo como vim parar aqui. Naquele momento de profunda Instabilidade creditei minha confiança aos movimentos em torno do trabalho que estava desenvolvendo na época. Não havia porque desconfiar daquele novo respiro que minha carreira tinha tomado. Mas o fato é que hoje eu tenho lá minhas dúvidas se a história que se desenrolou a partir dali teria sido obra do aleatório, ou uma profunda e elaborada conspiração de minha própria alma.

Quando um significado transita de uma língua para outra, parece que esse não consegue deixar para trás as poeiras de sua própria terra presa nos seus pés. Certos significados habitam em seu próprio país. As tentativas de alçá-los para outro lugar, inevitavelmente, fazem com que a palavra exerça seu direito de Perda e ganho. Nenhum significado existe de maneira inteira e estanque. E isso era o que me parecia fazer mais sentido em minha própria jornada como viajante. 50


Há dias que não posso escrever. É como se a escrita já não conseguisse nem mesmo esboçar as linhas do pensamento que tem me atormentado. A tradução sempre me levou a habitar em lugares suspensos. A realidade de uma e outra língua nunca se colocava em toda sua gravidade em meus modos de pensar. Entre uma língua e outra sempre há uma Lacuna intransponível. Um sítio de natureza informe em que a ideia de significado consegue fugir do martelo/bigorna que há nos significantes.

A primeira cidade em que me instalei ainda me ajudava a manter algumas características do cotidiano que eu há tanto custo queria evitar. Um mero fragmento de hábito era capaz de trazer a plena presença dele, ali onde eu estava. Ao que parece, não há exercício mais doído do que a expurgação de um amor que criou bases nos nossos modos de estar no mundo. Espécie de Zênite que nunca nos abandona. Uma coisa é aprender a alienar o corpo do outro. Uma outra, muito mais violenta, é alienarmos partes de nós mesmos porque nessas habitam, ainda que não queiramos, a voz eloquente de quem queremos esquecer.

Não consigo parar de imaginar que essa arquitetura em que se forja numa vida a dois, é coisa mais natural que nossa necessidade de Habitar a nós mesmos. No momento em que me encontrei com ela, pareceu que uma possibilidade completamente distinta desse costumeiro exercício do desejo: sem as falcatruas usuais, engenharias do medo. Sem as modalidades perversas de palavras lisonjeiras com mensagens truncadas. Tudo era dito às claras com palavras honestas de abertura para entender o mundo em volta. 51


Expandir o corpo vem depois de sangrar e dilatar a alma. Nos acontecimentos de todo dia. Nas decisões impensadas. Nos tumultos dos Gestos que pensam sentindo. Quando a consciência ganha horizontes, o corpo acontece.

Ainda – é cedo. Seria possível ouvir o corpo Expandir?

Não era justo comigo saber seus paradeiros. Porque todos os meus impulsos diziam respeito ao controle dos seus itinerários: por onde, para que, com quem? Uma cadeia obsessiva de pensamentos estrangulava qualquer possibilidade de vida interna pacífica. Míseros detalhes que lhe escapavam da Narrativa sobre seu dia promoviam laboriosas construções argumentativas para provar o óbvio: o caminho inútil do labirinto do fim.

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Luana Navarro (Maringá / Brasil, 1985), tem interesse por poéticas do corpo e questões políticas como dispositivo para criação artística. Sua prática é composta por trabalhos em fotografia, vídeo, textos, publicações e leituras. Em 2012 participou do Seminário de Fotografia Contemporânea no Centro de la Imagem na Cidade do México, em 2015 da exposição Develar y Detonar realizada durante o Photoespaña em Madri e no Centro Nacional das Artes na Cidade do México. Recebeu em 2010 o Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia– produção crítica e teórica. Participou da Bolsa Produção para Artes Visuais 05 em Curitiba. Atualmente está terminando o mestrado em artes visuais na UDESC em Florianópolis onde pesquisa as relações entre corpo, palavra, performatividade e tempo. Atua principalmente na cidade de Curitiba onde tem parcerias com artistas de diversas áreas. Luana Navarro (Maringá/Brazil, 1985) is interested in poetics of the body and political issues as triggers for artistic creation. Her practice consists of works in photography, video, texts, publications and readings. In 2012 participated in the Contemporary Photography Seminar at the Centro de la Imagen in Mexico City, in 2015 exhibited at Reveal and Detonate held during Photoespaña in Madrid and at the Nacional Arts Center of Mexico. In 2010 received the Funarte Marc Ferrez Photography Award - critical and theoretical production. Participated in the Scholarship for Visual Arts 05 Program in Curitiba. Currently is finishing the Master’s degree in Visual Arts at UDESC in Florianópolis, with a research in relations between body, speech, performativity and time. Operates mainly at the city of Curitiba, where has partnerships with artists from various fields.

AGRADECIMENTOS : Janaina Matter, Alejandro Castellanos, Alfredo Esparza, Amabilis de Jesus, Ana Casas Broda, Ana González, Ana Luisa Lima, Anuschka Lemos, Dagoberto Navarro, Daniel Lopes, Dominic Moschener, Elenize Dezgeniski, Eve Alcalá, Fabio Costa, Gerardo Montiel Klint, Gislaine Pagotto, Guilherme Jaccon, Gladis Tridapalli, Gregoria Cochero, Jose Luiz Flores Sanchez, Kolja Dominic, Lidia Ueta, Lourdes Navarro,

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Ana Luisa Lima (1978), nasceu em Recife, baseada em São Paulo, é crítica de arte, escritora e pesquisadora independente com foco em literatura e artes visuais – imagem e narrativa. Editora da revista Tatuí (2006-2015). Cocuradora do projeto “Poemas aos homens do nosso tempo – Hilda Hilst em diálogo”, Programa Rede Nacional Funarte 9ª edição, 2013. É representante, no Brasil, da revista sobre mercado de arte contemporânea e colecionismo latino-americano TONIC (Chile). Criadora da Cigarra Editora com selos para livros de arte e literatura. Autora do livro 16’39’’ a extinção do reino deste mundo, São Paulo-SP, 2015. No audiovisual, lançou seu primeiro curtametragem “Zona Habitável” (13’, Nova Lima – MG, Brasil, 2015). Atualmente, faz parte do grupo de crítica do Centro Cultural São Paulo. Ana Luisa Lima (1978) was born in Recife, living in Sao Paulo, is art critic, writer and independent researcher with emphasis in literature and visual arts – image and narrative. Editor of the Tatuí magazine (2006-2015). Co-curator of the project “Poems to the men of our time - Hilda Hilst in dialogue”, Funarte National Network Program 9th edition, 2013. Represents in Brazil the magazine about contemporary art market and latin-american collecting TONIC (Chile). Creator of Cigarra Publisher - arts and literature books. Author of the book 16’39” the extinction of this world’s realm, São Paulo – SP, 2015. In audiovisual launched in 2016 the first short movie Habitable Zone. Currently integrates the group of critics of São Paulo Cultural Centre.

Luciana Navarro, Luis Bezerra, Luiz Carlos Casagrande, Marcel Szymanski, Marcello Maria, Michel Navarro, Michelle Pucci, Milla Jung, Miriane Figueira, Patricia Lion, Paulo Reis, Raquel Stolf, Regina Melin, Ronie Rodrigues, Vivaldo Vieira Neto, funcionários do Solar do Barão, do Museu da Fotografia Cidade de Curitiba e todos aqueles que de algum modo colaboraram na realização deste trabalho.

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LISTA DE TR ABALHOS List of artworks

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05

Para viagens longas, para viagens curtas, 2012 Fotografia impressa sobre papel algodão, 30x45 cm For long trips, for short trips, 2012 Photographic print on cotton paper, 30 x 45 cm

08-10

Murmuro, 2013/2015 Fotografia impressa sobre papel algodão e vídeo digital (4’05’’), dimensões variáveis Murmur, 2013/2015 Photographic print on cotton paper and digital video (4’05’’), variable dimensions

11-13

Micro-Resistências, 2008-2016 Série fotográfica e videográfica, dimensões variáveis Micro-Resistance, 2008-2016 Photographic and videographic series, variable dimensions

14-15

Acidentes são reais, 2012/2015 Intervenção sobre fotografia, 15x21 cm, México

Accidents are real, 2012/2015 Intervention on photography, 15x21 cm, Mexico

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Risco, 2015, vídeo digital, 5’10’’ Risk, 2015, digital video , 5 ‘ 10 ‘’

17-33

Perro, ou arroz de puta, ou o dia em que minha avó quebrou um prato na cabeça de minha tia, 2010-2016 Fragmentos do livro de parede, textos impressos em acetato dispostos em estrutura de madeira, 30x22x12 cm

Perro, or whore rice, or the day my grandmother broke a plate on my aunt’s head, 2010-2016 Fragments of the wall book, printed texts on acetate arranged in wood structure, 30x22x12 cm

36-39

Corpo concreto, 2012/2015 Intervenção sobre fotografia, 15x21 cm, México

Concrete body , 2012/2015 Intervention on photography, 15x21 cm, Mexico

40-41

Fala e não diz nada, 2012/2015 Intervenção sobre fotografia, 15x21 cm, México

Speaks and says nothing, 2012/2015 Intervention on photography, 15x21 cm, Mexico


ENGLISH VERSION (B O O K COV E R )

FRONT FLAP - COVER BOOK

Body without synonymous can be seen as a series of events, I exhibit distinct works in photography, videos and texts, constantly dialogue with the performance, inaugurate the library for bodies in expansion. I speak of daily resistances. Make daily gestures. It is my body and it’s not. What body is this that doesn’t rest? ----------- In entries or how to recognize a body without synonymous by Ana Luisa Lima. For eight years I remain. I keep on having panic of dead exhibitions. I can only make a sense of it if the space is alive, if there are voices, if there are step noises through the rooms, if there’s someone who tries to put a hand on the image. The exhibition as a gesture of affection. The library is a proposition that builds a fluid space within the exhibition, it can also happen in other places. What interests me is it’s potential to propose relations from the words that compose it: library / body / expansion, 57


on a certain multiple and moving image that embraces the works and that is a space for other artists and non-artists to act.

BACK FLAP

I don’t see the library in terms of curatorial actions, i would like my position above all to be seen and kept as one of an artist. The terms curator or independent curator don’t interest me. I propose, I imagine, I project, I test, I organize, I suggest, I listen, I take care, I divulge, I document, I share, I question the format itself, I act, I trade, I play, I invite,

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FI C H A TÉC N I C A Credits Luana Navarro Artista / Artist Ana Luisa Lima Curadoria / Curator Milena Buzzetti Produção / Production Leonardo Muller Assistência de produção / Assistant to production Caroline Schroeder Design gráfico / Graphic design Janaina Matter Tradução / Translation Paula Melech Assessoria de imprensa / Press manager Guilherme Jaccon Mídias Sociais / Social Media Cristian Teles e Fer Stancik Montagem / Installer Lucas Amado Iluminação / Lightning design

Dados internacionais de catalogação na publicação Bibliotecária responsável: Mara Rejane Vicente Teixeira

Navarro, Luana. Corpo sem sinônimo / Luana Navarro. - Curitiba, PR : Cigarra, 2016. 48 p. : principalmente il. ; 19 cm.

Texto também em inglês. Exposição realizada no Museu da Fotografia Cidade de Curitiba, de18 de fevereiro a 20 de abril de 2016. ISBN 978-85-69848-01-1 1. Navarro, Luana – Exposições. 2. Arte – Séc. XXI Curitiba (PR) – Exposições. I. Título. CDD ( 22ª ed.) 709.81621

Tiragem: 900 exemplares

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Composto em Myriad Pro Miolo em papel pólen soft 80 g e vegetal 92 g Capa em papel triplex 300 g

PROJETO REALIZADO COM O APOIO DO PROGRAMA DE APOIO E INCENTIVO À CULTURA FUNDAÇÃO CULTURAL DE CURITIBA E DA PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA

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